terça-feira, 19 de julho de 2011

O Horror na Guerra


Hanna surgiu furtivamente pelo rombo da parede lateral do prédio em ruínas. Naquele momento ouvia-se só o som longínquo de uma sirene nas apertadas ruas e becos daquele bairro polonês. Os alemães ainda vasculhavam o que havia sobrado do verdadeiro arrastão de horror dentre os civis. Hanna certificava-se de que nenhum deles estava por ali. Dobrou o bilhete encardido e enfiou nos bolsos do casaco surrado. A madrugada estava gelada, e seus passos ecoavam a cada corridinha nervosa a procura de sombra para se esconder. No pensamento, numa fração, entendeu o viver de uma barata, correndo e se enfiando nos cantos com medo das botas nazistas.

Voltou a concentrar-se na missão. Apesar de saber de cor o endereço, volta e meia checava o bilhete com a informação. Valioso objetivo, ela tinha de ter o produto nas mãos.

Dali já avistava o prédio escolar de esquina, bem danificado por algum canhão do Fuhrer. Precisou ficar agachada na sombra, por pelo menos dez minutos, pois uma dupla de “capacetes de penico” passou conversando. O cheiro de urina daquele canto era tão forte que seus olhos ardiam.

Correu até o colégio destruído e atabalhoadamente jogou-se por sobre um pedaço de muro caindo muito perto de dois corpos mortos. Percebeu que se tratava de duas crianças. Segurou a revolta no peito junto com a vontade de vomitar.

Um avião passou voando baixo e o som deu-lhe um susto. No entanto sabia que nunca alguém enxergaria um inseto numa distância daquelas. Sim, um inseto, definitivamente sentia-se como um inseto.

- Ah se pelo menos eu tivesse asas como um pernilongo. Pensou.

Depois de mais algumas manobras dentre entulhos e corpos, avistou a pequena capela logo após o terreno do cemitério. Apesar das paredes tomadas por fuligem a pequena casa de orações estava de pé. Conforme instruído encontrou o esconderijo nos fundos, um buraco coberto por um pedaço de madeira. Deu duas batidinhas e sussurrou.

- Sou eu! Hanna! Wander que me mandou para pegar o Funcho!

Num minuto a madeira foi mexida por dentro e alguém apenas empurrou para fora um pacotinho de papel pardo do tamanho de um maço de cigarros.

Hanna com todo cuidado colocou o embrulho no bolso e começou seu retorno arrastando-se até o portão do cemitério adjacente, onde teve de pausar e fingir-se de morta, pois um pequeno pelotão e uma moto transitavam ali perto. Depois de fingir-se de morta pertinho da casa dos mortos e vendo que os nazistas haviam se distanciado resolveu se nomear zumbi e saiu numa pequena disparada de volta ao seu lar de escombros. Alguém dentre os alemães percebeu e logo tiros e gritos ecoaram na madrugada escura.

Ofegante, ela conseguiu camuflar-se num monte de lixo de fedor fumegante. O pior do momento já tinha passado, graças a Deus não havia sido ferida.

Finalmente depois da jornada de inseto conseguiu retornar ao seu cantinho de sobrevivência. Ali sua velha mãe esperava. No outro canto estava Wander e sua perna mutilada.

- Graças a Deus! Disse a velha com uma criança que chorava desesperadamente no colo.

- Trouxe o Funcho? Perguntou Wander.

Após resposta positiva, Wander lhe entregou uma caneca de lata com um dedo de água. Ali socaram o funcho e fizeram o que parecia ser um projeto de chá. Deram a criança. Em dois minutos o choro parou. Olharam-se incrédulos. Teria sido mesmo o efeito do chá? Será que as cólicas teriam sumido exatamente naquele momento por coincidência? Nada disso importava. Nem mesmo faziam questão de saber. Apenas deitaram-se todos agrupados e em silêncio.

De repente, Hanna ouve um ruído! Seu coração está disparado. Olha o bebê e suspira aliviada. Ele esta dormindo serenamente. O barulho, provavelmente, era apenas alguma metralhadora matando alguém na vizinhança.