sexta-feira, 11 de setembro de 2009

O Forte Apache


Tudo que o garoto pensou no instante em que o pai tirou o brinquedo da mala foi:

- Como ele conseguiu? Um Forte Apache era tudo que eu queria e nem me lembro de ter pedido.

Naquele momento o menino sentiu-se de fato feliz. Era uma caixa muito bacana. Na frente o desenho de soldados da sétima cavalaria em seus cavalos lutando contra um grupo de índios. Um pouco acima os rostos de um general e de um guerreiro Pele Vermelha lado a lado sob a inscrição Forte Apache. Era uma caixa de papelão brilhante, muito colorida devia ter uns quarenta centímetros de largura. Os homenzinhos eram pintados em detalhes e não em uma cor só. Algumas paredes do forte eram realmente de madeira, o que fez surgir comentários do tipo: Olha só! Que bacana! É de madeira! O menino não sabia, mas havia no ar algo bem mais valioso do que aquele pequeno exército, aquela pequena tribo e seus cavalinhos brancos com selas coloridas.

O tempo é engraçado, faz miséria na concepção das coisas. As vésperas daquele aniversário o garoto via cada dia como se fosse uma eternidade. Aos poucos esses dias começavam a diminuir. Semanas vão se entregando fácil, meses vão sendo atropelados e anos já não representam grandes coisa. Aniversários então se tornavam de mágicos a marcantes, de marcantes a diferentes, de diferentes a nem tanto e de nem tanto a monótonos.

Nascemos imaculados e na infância carregamos a mais valiosa carga do mundo: Pureza. Feliz daquele que consegue carregá-la no coração o maior tempo possível. Mas a verdade é que mais cedo ou mais tarde até a inocência adoece. Assim como todo mundo o garoto foi aniversariando e outros presentes vieram. O velho já não lhe dava mais brinquedos, nem bicicleta nem jogos. O negócio passou a ser dinheiro, roupas, e com os anos, só os parabéns por telefone. O tempo é absoluto em tudo. Se ele pode até endurecer a fumegante lava de um vulcão, por que não petrificaria corações?

No tempo do Forte Apache o garoto tinha uma preocupação. Ele imaginava como estaria mais ou menos com a idade do pai. Teria um mundo nas costas? Teria as mãos capazes de fazer pequenas mágicas com cartas de baralho?

O tempo fez o que melhor sabe fazer. Voar!

Todo aquele exército de cavaleiros liderados pelo generalzinho foi sucumbindo a cada batalha. A cada novo embate já não havia tantos homens pra contar histórias. Assim como na vida real ali no mundo das miniaturas o tempo foi cruel. Os apaches foram extintos, os Ianques eram esquecidos e os cavalinhos abandonados num canto qualquer do quintal. A verdade é que numa pequeníssima fagulha temporal, toda aquela geração de corajosos guerreiros sumiu do mapa. Nem mesmo a fortaleza deixou ruínas.

Setembro, como em todo ano surge com tambores, bandeiras e anúncios de flores. O garoto já não pode mais ser chamado de garoto, ele já tem muitas respostas àquelas perguntas de menino. Não existem mais indiozinhos, bicicletas e tabuleiros. Nada disso lhe faz falta, a não ser o toque do telefone.

2 comentários:

Profª Rita disse...

Sacanagem, esse tocou no fundo da alma... O final foi de arrasar. Muito emocionante. Tô com os olhos marejados. Eu também sinto falta do toque do telefone...

Renato disse...

Uma grande verdade.